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FLOR DE BUCHA

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  糸瓜咲て痰のつまりし仏かな  ( 子規 ) hechima saite tan no tsumarishi hotoke kana   pé-de-bucha em flor, sufocando no catarro o próprio buda! O kanji de “buda”  仏  (a forma antiga era  佛 ) significa igualmente “defunto”. Este haiku é um  jisei  (poema de morte) de  Masaoka Shiki  (1867-1902).

VENDO A LUA – coleção de haicais de Seishin

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Pixabay     Dia do Haicai conto mentalmente as sílabas antes de escrever   três garças à espreita seguem passo a passo os bois ao longo do pasto   gralhas do campo a leitura interrompida à sombra da árvore   pasto de inverno volta e meia voam garças nas costas dos bois   chuva intermitente atravessa a noite o canto do quero-quero   cafezal em flor a noite vem sobre os campos brancos brancos brancos   vai-se a primavera um livro de haiku nas mãos e tantas saudades   Domingo de Ramos dois ou três galhos de murta murchos sobre a mesa    Missa de Aleluia ingênuo sonho de infância ser padre também   dia ensolarado filhote de lavadeira a ensejar o voo   sol no horizonte na cumeeira da casa um... dois sabiás   manhã...

APONTAMENTOS

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    Matsuo Bashô por Katsushika Hokusai 「 瓶わるる夜の氷のねざめかな 」 kame waruru yoru no kôri no nezame kana   parte-se o vaso ah... súbito despertar do gelo da noite Bashô   Matsuo Bashô (1644-1694) é o mais venerado poeta de haicai do Japão. Uma vez, ensinando-me haicai, minha mestra citou este em japonês. Parece que alguém acorda, no meio da noite, por causa do barulho do jarro que se quebra devido ao gelo. Isso também sugere despertar em outro nível de consciência. Este poema me toca profundamente!   *   「岩鼻やこゝ に もひとり月の客」 iwahana ya koko ni mo hitori tsuki no kyaku   no cimo da rocha — um convidado da lua também solitário Kyorai   Kyorai (1651-1704) foi um dos mais notáveis discípulos de Bashô. Neste haiku, ele vislumbra alguém, tão sozinho quanto ele, a contemplar a lua em uma noite no rochedo. A lua é anfitriã... No livro de notas de Kyorai, que nunca foi publicado em português, há interessante co...

CORAÇÃO DE HAIJIN

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Deparei-me, na primeira conferência de São João Cassiano sobre a virtude monástica [1] , com algo que a meu ver ilumina o caminho do haicai. Não posso sentir o mundo fora da dimensão contemplativa e disciplina inerente ao meu estado de vida, pois é só o que tenho em meu cotidiano. Assim, a interpretação que farei de alguns pontos da referida conferência – não sob perspectiva religiosa, mas haicaística – talvez sirva apenas a meu propósito e não faça sentido a outros. O escrito que me inspira esta reflexão é de um tempo em que sequer havia haicai no mundo, como coisa que se pudesse exprimir em palavras ao modo de Bashô. Este, esperaria ainda mais de mil anos para nascer. [2] Porém, um grande ensinamento serve para os caminhos de todos os tempos. É com tal convicção que ponho em diálogo os padres do deserto e o tesouro inestimável que foi legado ao mundo pelos poetas do Japão, isto que chamamos de haicai, um modo de encarar a vida.        O santo homem e seu amigo...

ÁRVORE ESPLÊNDIDA...

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Imagem Pixabay   Rodada de haicais, sobre a Sexta-feira Santa, do Grupo Zen do Haicai. Avaliação que me foi solicitada pelo seu coordenador, o Sr. Carlos Martins. De muitas dezenas, elegi um haicai. Além dele, selecionei outros cinco que considerei bons e sobre os quais primeiramente discorrerei.   O som das matracas dá início à procissão — Sexta-feira Santa Mônica Monnerat   Dia da Paixão — o penitente cansado se apoia na cruz Renan Sarajevo   Os dois haicais acima citados são um bom exemplo de contenção. À primeira vista, parecem meramente descritivos e pouco interessantes. Mas, notem, sem ênfase são exatamente o que devem ser! Têm – nem mais nem menos – o suficiente que se espera de um verdadeiro haiku. Matraca é um pedaço de madeira com uma plaqueta de ferro e argolas, as quais agitadas em torno do eixo fazem barulho peculiar. Isso substitui, em dias penitenciais, o sino – que não pode ser tangido na Sexta-feira Santa. Em meu convento a ouvimos fartamente, por es...